Brasil tem encontro marcado com a crise, afirma Maílson da Nóbrega sobre contas públicas



Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado/Arquivo
Maílson da Nóbrega, ex-ministro da Fazenda 02 de junho de 2025 | 21:17

Brasil tem encontro marcado com a crise, afirma Maílson da Nóbrega sobre contas públicas

Para Maílson da Nóbrega, ex-ministro da Fazenda, o Brasil está com dias contados até a próxima grande crise econômica. Desta vez, motivada por um estrangulamento da máquina pública pelos gastos do governo, sobretudo após os riscos de um “apagão orçamentário” em 2027 terem sido apresentados durante o PLDO (projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias).

Segundo ele, o país construiu um sistema fiscal insustentável na Constituição de 1988 ao colocar como norte o combate à desigualdade social e à pobreza pelo aumento de gastos públicos, e não pelo incentivo à capacitação profissional e à produtividade.

“Isso começa pela Previdência, que corresponde a 52% das despesas primárias. Quando se consideram os gastos com educação, saúde, programas sociais como o Bolsa Família, esse percentual chega a 94% do orçamento primário. Sobram 4% para financiar ciência, tecnologia, cultura, infraestrutura, seguro rural [despesas não obrigatórias]… Isso é insustentável”, afirmou o ex-ministro em evento do site Monitor do Mercado, em São Paulo, nesta segunda-feira (2).

Com a entrada dos precatórios (dívidas decorrentes de sentenças judiciais) no limite de gastos do arcabouço fiscal a partir de 2027, como previsto pelas regras atuais, boa parte do espaço destinado a despesas não obrigatórias terá que ser enxugado, e o que sobrar ainda será repartido com emendas parlamentares. O risco de um apagão foi admitido pelo secretário de Orçamento Federal do Ministério do Planejamento, Clayton Montes, durante a apresentação do PLDO.

“Para 2027, o número é bastante comprometedor. Já comprometeria a realização de políticas públicas. O valor não comporta todas as necessidades do Poder Executivo”, disse Montes.

Maílson considerou essa declaração como “corajosa”.

“Foi incrível ver o governo admitindo que não terá dinheiro para ciência, tecnologia e mais todo o resto. Os sinais disso estão presentes há um tempo. Falta dinheiro no IBGE, nas universidades federais, no Exército. Sempre foi difícil prever quando o colapso chegaria, mas agora não é mais. O Brasil tem um encontro marcado com a crise, e ela vai acontecer até 2027”.

E, com essa constatação, o ex-ministro da Fazenda ponderou que não há como deixar de financiar a máquina administrativa. “Ou haverá o abandono do arcabouço fiscal, ou serão criadas tantas exceções a ele que a credibilidade do regime será deteriorada”, afirmou.

Segundo ele, o método de lidar com o desastre fiscal “instalado pela Constituição de 1988” se esgotou. Isto é, o governo não consegue cortar gastos e opta pelo contingenciamento, que impactarão instituições dependentes das despesas discricionárias. Ele citou como exemplo a recomposição financeira de institutos e universidades federais anunciada na semana passada pelo Ministério da Educação, que anunciou a liberação de cerca de R$ 300 milhões que estavam represados.

“E ultimamente teve essa questão do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras). Se eu estivesse no governo, eu teria feito a mesma coisa, porque não há mais alternativas [a não ser o aumento da arrecadação]. Você vê com frequência bons analistas dizendo que o governo precisa fazer um corte de gastos, como acontece em empresas. Mas o governo não é uma empresa, e a alternativa tem sido esse adiamento de despesas, que se torna inviável ao longo do tempo”.

Apesar da iminência da crise, Nóbrega considera que o Brasil está preparado para superá-la. Ele cita o sistema financeiro sólido daqui e a pujança do agronegócio, que torna o país “estruturalmente superavitário”.

A solução será “capitalizar a crise”, um termo usado pelo Banco Mundial que significa aproveitar da situação de anormalidade para promover reformas que outrora seriam rejeitadas.

“Essa crise pode ser bem-vinda. O Brasil pode inaugurar a quarta grande fase de reformas estruturais de sua história recente, e o primeiro passo já foi dado com a reforma tributária, que ocorreu mesmo sem crise, porque derivou do trabalho de um grupo de pessoas que decidiu, por experiência de trabalho e da academia, propor uma racionalização do sistema de tributação do consumo”.

A reforma tributária, para ele, “é a maior e melhor reforma estrutural desde os anos 1960”.

“Nada parecido aconteceu em seus efeitos em termos de racionalidade, de contribuição para a eficiência e para a produtividade. Se há uma boa notícia nisso tudo, é essa”.

Tamara Nassif/Folhapress



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